sexta-feira, 15 de maio de 2009

D'ALMA


Serpenteiam-se chicotes, desapertam-se garrotes, soçobram-se pinotes.



Na manhã de que me ergo

não há tarde

que a cale

não há fardo

que a escale

não há dedo

para o caule.



Na manhã de que me ergo

não há noite

que a monte

não há açoite

que a afronte

não há ponte

para a fonte.



Na manhã de que me ergo

a tarde

chega cedo

a noite

traz o medo

o dia

dói-se quedo.



E vendem-se vómitos, e colhem-se frémitos. E abro as páginas, folheio os ventos, salteio os tempos. Abro crateras, tenteio poeiras, renasço nas beiras. Sei-me vendido, prostrado, calado. Sei-me sugado, rendido, bastado. Sei-me sem chicote para estalar, sem caminho para vencer, sem conta para fazer. Sei-me. Sei-me cálice, álcool, ventre. Sei que sente, sei que mente – a nascente, a poente, a oriente.



Sei que sou.

Sei que sou
gente.
Confúcio Costa

1 comentário:

SILÊNCIO CULPADO disse...

De forma poética um grito que representa todos os gritos que se acumulam. Cresce o exército dos proscritos aqueles que não têm acesso ao emprego, que são esvaziados, espoliados, remetidos para as abas da vida.
Porque não há justiça há quem trabalhe por um salário que não chega para viver.
No alto do consumismo, bêbedos de riso, os exploradores insensíveis.


Abraço