Ontem, na cimeira informal de líderes da União Europeia, voltámos a ver Pedro Passos Coelho ao lado de Angela Merkel na recusa do mecanismo de
eurobonds que não apenas aliviaria drasticamente o peso dos juros da
dívida nas contas públicas portuguesas, como ainda proporcionaria maior
competitividade a um tecido empresarial português com acesso a crédito
mais barato. E há uma grande diferença entre os dois. Angela Merkel é
alemã, Passos Coelho é português. Estará convencido do contrário.
O estado alemão é o que menos paga em juros na Zona Euro:
1,5% por dívida a 10 anos. A taxa recuou a semana passada para um novo
mínimo histórico. Ainda ontem, a Alemanha vendeu obrigações a 2 anos com
um juro próximo de 0%, 0,07%.
Leu bem. A média do custo de financiamento dos últimos dois anos é de
2,48%, muito menos do que o país historicamente alguma vez pagou. E já
adivinhou de onde são as três empresas que menos pagam pelo
financiamento entre as 600 maiores cotadas europeias. Da Alemanha,
claro.
De
facto, o negócio da austeridade tem-se revelado bastante lucrativo para
a Alemanha. Financia-se a uma média de 1,5% e “ajuda” os países da
periferia em dificuldades a cerca de 5%, ou seja, obtendo uma margem de
aproximadamente 3,5%. Isto já para não falar dos lucros que o sector
financeiro alemão consegue amealhar obtendo liquidez junto do BCE a 1% e
depois utilizando-a na compra de dívida dos países da periferia a juros
5, 10, 30 vezes esses 1%. Por exemplo, as OT a 2 anos do país de origem
de Passos Coelho ultrapassaram hoje os 14,6% no mercado secundário. “Tudo perfeitamente normal”, como diria aquele seleccionador nacional de futebol que não ganhava uma. Artur Jorge, lembram-se?
Quem diria que, vários anos depois, teríamos um Primeiro-Ministro a funcionar no mesmo registo “tudo perfeitamente normal”. Passos Coelho: Números da execução orçamental "não nos surpreenderam".
Referia-se à aceleração da deterioração das nossas contas públicas que
continuou a verificar-se entre Março e Abril. A receita continuou a
cair, apesar do aumento brutal da carga fiscal. A despesa continuou a
aumentar, apesar do roubo de subsídios de férias e de Natal a
funcionários públicos e apesar dos cortes brutais nos sectores da Saúde e
Educação, principalmente nestes.
Mas
desenganem-se aqueles que apressadamente concluem que tudo isto é mera
estupidez natural. Não existe estupidez natural quando há quem esteja a
ganhar rios de dinheiro. Não é só na Alemanha que a crise está a fazer
milionários. Não é à toa que há uma auditoria à dívida portuguesa que
PSD, PS e CDS recusam como recusam. O
Estado gastou 323,8 milhões de euros com as parcerias público-privadas
(PPP) entre Janeiro e Março, valor que compara com os 251,3 milhões
despendidos pelos cofres públicos no primeiro trimestre de 2011 e que
traduz um acréscimo de 28,8%. Mudou o Governo, mas apenas isso. As clientelas são as mesmas.
Quanto
aos cerca de 1,2 mil milhões de euros em juros que pesam na execução
ontem divulgada, que poderiam reduzir-se para apenas cerca de 250
milhões com a aprovação do mecanismo de eurobonds que Pedro Passos
Coelho não quer, traduzem tanto a recapitalização de um sector
financeiro na ressaca de duas décadas de desvarios que, se tornados
públicos, forçariam a sua nacionalização, como ainda, e sobretudo, a
ausência de sondagens que traduzam uma pressão política capaz de
convencer Passos Coelho de que é português e não alemão. Os portugueses
compreendem. Compreendem sempre. Pobrezinhos mas honrados. Repete-se,
são elogiados por essa Europa fora. "Os portugueses pagam", diz-se "lá
fora". Trocam elogios pela dignidade do seu presente e pelo direito a um
futuro.
País do Burro
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